quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

AMOR E REVOLTA – CAPÍTULO XIII








-Eu sou completamente apaixonado por essa menina, gente... estou literalmente de quatro. 

Gabi se encolheu. O joelho de Marvin tocava a perna dela acidentalmente, e ele nem se dava conta 
das emoções que aquilo causava nela. Marvin continuou:

-Mas parece que ela não se sente da mesma forma.

-Ela não gosta de você, irmão?

Melissa perguntou com tanta doçura, que até os amigos estranharam um pouco. Mas respondeu:

- Não é isso. Ela gosta, mas não do mesmo jeito. Jane é... um espírito livre. Ela sempre faz o que quer e não se compromete com nada, a não ser com seus próprios sentimentos e desejos. Ela foi criada assim.

Gabi não conseguiu se segurar:

-Em resumo: ela é uma egoísta!

Marvin olhou-a surpreso, mas não a contradisse. Nunca tinha pensado daquela forma antes. Talvez Jane fosse uma egoísta. Mas como arrancar aquela paixão de dentro dele? Gabi desculpou-se em seguida, mas ele a tranquilizou:

-Não, você pode estar certa, amiga. Ela é sim, um tanto egoísta, mas ao mesmo tempo... passa horas por semana na ONG, brincando com crianças. Também recolheu três cães abandonados em casa, e cuida deles com todo carinho. Ela tem um lado bom e generoso. Mas eu confesso que não é por este lado bom e generoso que eu me sinto atraído, é... pelo lado apaixonado, voraz, quase selvagem dela que eu estou de quatro. 

Luis concluiu:

-Ou seja, você gosta de transar com ela, e está confundindo isso com amor. Mas é só paixão, pura e simples.

Marvin riu:

-Simples??? Quem dera que fosse simples! Mas não é só paixão, Luis.

Gabi colocou a mão no joelho de Marvin, fazendo-o olhar para ela:

-Pois é. Quem dera que fosse simples. Acho que o amor é bem mais complicado do que a paixão, porque a paixão um dia acaba, mas o amor, ao contrário, é capaz de sobreviver às piores coisas. Duas pessoas podem não ficarem juntas por vários motivos, mas continuam se amando. Ou o amor não correspondido... este dói, mas pode não acabar nunca, mesmo quando aparece outra pessoa. 

Os três ficaram pensando no que ela acabara de dizer. Melissa falou:

-Eu nunca amei ninguém, nem nunca me apaixonei. E olha que já fiquei com uma porção de carinhas. Mas nunca por mais que uma semana. 

Luis opinou:
-O que você disse foi bonito, muito profundo, Gabi. Nunca pensei que você tivesse essa maturidade de sentimentos.

Ela corou; olhou para Marvin, que nada disse. Mas ele estava pensativo, considerando o que acabara de ouvir e pensando no que sentia por Jane: seria amor ou apenas paixão? E sentir amor doía menos do que sentir paixão? Só sabia que era forte, e que o deixava louco, ansioso e inseguro. Tinha muito medo do dia em que ficaria sabendo que ela tinha ficado com outro menino. E ele sabia que um dia, aquilo ia acontecer, pois ela nunca descartara aquela possibilidade. Era sincera a respeito. E o que ele faria, então? Aceitaria ou terminaria tudo com ela?

Melissa se levantou e escolheu uma música no aplicativo. Era uma canção que fazia parte da vida deles. Eles a tinham dançado no último aniversário de Luis, que tinham ido comemorar em uma danceteria. Os quatro ficaram envolvidos pela música, lembrando daquela noite, há quase um ano, quando eles eram os melhores amigos. A intimidade que tinham, a alegria de estarem juntos sempre. Melissa fizera aquilo de propósito, pois pretendia trazer o irmão de volta. Ela começou a dançar, e logo todos estavam dançando juntos, perdendo-se ao sabor da música. 

Quando a música terminou, eles se jogaram no sofá, rindo. Melissa disse:

-Sentimos sua falta, Marvin. Sentimos muito a sua falta. A vida é isso: momentos. Pessoas. Alegrias e tristezas que não podemos ignorar. Não nos deixe de novo, não nos abandone, porque nós sentimos a sua falta.

Marvin ficou surpreso, sem saber o que dizer. As emoções se misturavam dentro dele. Sabia que a irmã estava certa: ele havia abandonado aquele grupo: seus dois melhores amigos e sua irmã. Tantas coisas que já tinham vivido, tantas curtidas, saídas, risadas... ele era tão feliz quando estava com eles! Para onde tinham ido aquela inocência e leveza? 

Ele não se identificava com os amigos de Jane. Eram diferentes dele. Pareciam apenas tolerá-lo. Mal falavam com ele quando estavam juntos, referindo-se à Jane na maior parte do tempo, e respondendo ligeiramente quando ele lhes falava. Ele se sentia “de fora.” Mas mesmo assim, tentava entender-se com eles, e várias vezes os convidara para sua casa. Eles iam quando Jane ia também. Ele sentia que era quase hostilizado pelo melhor amigo dela, que era Juninho, o amigo gay. Todo mundo dizia que a amizade entre uma mulher e um amigo gay poderia ser muito profunda e verdadeira, e Marvin tentava se convencer de que as horas que os dois passavam juntos eram apenas por amizade. Mas Juninho – o mesmo menino que Jane beijara na boca ao chegar na escola, na primeira vez em que Marvin a vira – parecia ter ciúmes dele, ou não aprová-lo por algum motivo. Marvin tentava ser simpático com os amigos de Jane. E aquilo fazia com que ele se sentisse um pouco tolo. Mas ele faria qualquer coisa para fazer parte do mundo dela... mas valeria a pena? Pela primeira vez, ele se perguntava. 

Gabi quebrou o silêncio, cortando os pensamentos dele:

-Marvin, eu sei que não ajuda muito, mas tem uma coisa que eu quero que você saiba, e que já vem acontecendo há algum tempo, mesmo antes de você ficar com a Jane. Nem sei como começar, só sei que você deve saber. Porque tem a ver com você. Não acho que você tenha que fazer algo a respeito, só quero que você saiba!

-Fala logo, Gabi. Está me deixando nervoso!
Gabi sentiu o rosto ficar vermelho, e em seguida, muito pálido e frio. Respirou fundo, tomou coragem e confessou:

-É que eu... gosto de você. Estou apaixonada. Ou talvez eu te ame. É isso, eu te amo.

Marvin soltou a respiração de repente, deixando o queixo cair. Ele a olhou como se a enxergasse pela primeira vez na vida. Não conseguiu ver na menina que ele conhecia desde sempre, alguém por quem ele um dia pudesse se apaixonar. E Gabi leu aquilo na reação dele, nos olhos dele, e até mesmo no jeito com que ele pareceu desconfortável. Mesmo assim, ela sentiu um grande alívio por finalmente confessar o seu amor escondido. Até mesmo Luis ficou surpreso, pois apenas Melissa tinha conhecimento de como ela se sentia. 

Ele a chamou para fora, para ficar sozinho com ela. Os dois foram dar uma volta no jardim.

-Olha, Gabi, você sabe o quanto você é querida para mim. Uma amiga de infância, alguém muito importante na minha vida. Mas eu estou apaixonado por outra.

-Eu sei, e não quero que se sinta mal por isso. Fique tranquilo, não vou jamais assediar você ou cobrar alguma coisa. Só te disse porque eu quero que saiba. 

“Diabos”, ele pensou. “Por que isso agora? Já não chega tudo com o que estou tendo que lidar, e agora essa confissão fora de contexto e de hora? Não quero magoar uma amiga!” Ele passou o braço em volta do ombro dela, como sempre fazia quando estavam conversando e caminhando juntos. Mas daquela vez, ele se sentiu diferente, incomodado.

-Obrigada, Gabi. Saber que eu sou amado por você me deixa honrado e feliz, mas triste também, porque apesar de te amar como amiga, não posso te dar mais que isso. 

O rosto dela estava sereno e conformado. Ela concordou com a cabeça, e após dirigir a ele um pequeno sorriso, abraçou-o pela cintura e os dois voltaram para dentro da casa juntos, como bons amigos.

Dois dias depois, Marvin ainda não tinha feito contato com Jane novamente. Ele estava queimando de vontade de vê-la, mas o que os amigos lhe disseram – que ela era egoísta e que não o amava tanto – tinham exercido um efeito sobre ele.  Ela também não o procurou mais, embora estivesse muito triste. Pensou que talvez fosse melhor daquela forma.

Juninho, que esteve sempre com ela naqueles dois dias, notou o sumiço de Marvin e a tristeza dela. No fundo, ele estava aliviado por Marvin não estar por perto; não gostava dele. Achava que a amiga merecia coisa bem melhor. Marvin, ele pensava, não passava de um playboyzinho conservador, um machistazinho ainda não definido. Mas ver a amiga triste o deixava triste também. Juninho amava Jane, pois fora ela que o ajudara a dizer aos pais que ele era gay. Ela ficou do lado dele e segurou sua mão, e não soltou nem mesmo quando o pai teve um ataque de nervos – e desde então, parou de falar com o filho, embora vivessem na mesma casa e ele continuasse a pagar pelas despesas de Juninho. E era sempre Jane que segurava sua mão enquanto ele chorava. Mesmo a contragosto, ele perguntou o que tinha acontecido. Jane olhou para ele, acariciando a mão que estava pousada em seu joelho.

-Ele anda sumido, Juninho. Tivemos uma briga. Eu disse algumas coisas que não deveria ter dito... eu o magoei muito.
Juninho respirou fundo:

-Você gosta do bofe, não é?

-Gosto. E de um jeito que eu nunca gostei de alguém antes. Pela primeira vez eu pensei em ficar só com uma pessoa, em todos os sentidos.

-Ih... então é sério mesmo, amiga. Você nunca acreditou em fidelidade.

- Acho que eu percebi que quando a gente gosta realmente de alguém, não precisa de mais ninguém. Essa pessoa te completa em todos os sentidos. Se não for assim, não é de verdade.

-Já falou com a Sunny sobre isso?

Sunny também acolhia e aconselhava Juninho como se fosse seu próprio filho, e o menino a amava e respeitava por isso.

-Não acho uma boa ideia... minha mãe teria um gato pela boca se soubesse que eu estou cultivando pensamentos um tanto... conservadores. Com certeza tentaria me afastar do Marvin. 

-Não duvido. Mas acho que é você que tem que decidir isso. Bem, você sabe que eu não gosto muito do Marvin, mas se é ele que te faz feliz, então eu aprendo a gostar. Vai lá, menina, liga pra ele! 

Manda uma mensagem, faz qualquer porcaria!

Sunny tentou sorrir, mas não conseguiu. Ligar para o Marvin era o que ela mais desejava fazer. Mas ela sabia que no fim da história acabaria por magoá-lo. Ela sabia quem ela era, e quem ele era, e que os dois não poderiam ficar juntos sem que houvessem muitos desentendimentos e sofrimento.

-Obrigada, amigo, mas acho melhor deixar assim... sabe, ano que vem eu vou para a faculdade, e pretendo estudar em outra cidade. Quem sabe, em outro país. Por que insistir em algo que não pode dar certo? 

-Jura? Pensei que fosse tirar um ano sabático. Pelo menos, foi o que você me disse.

-Desisti. Acho melhor dar um tempo desse lugar, dessas pessoas e do Marvin.

-E de mim?!

-Você sabe que é bem-vindo se quiser vir comigo. 

-Então vamos para Paris! Vamos estudar belas artes lá! 

O pensamento louco e entusiasmado do amigo fez Jane rir de verdade:

-Sabe que não é má ideia? Talvez seja bom. Talvez você esteja certo!

-Então... quando partimos?

E então Jane começou a realmente considerar aquela ideia. 

(continua...)





Um comentário:

  1. Mais um interessante episódio que gostei de ler. :))

    Hoje:- Amanhecer inquietado
    -
    Bjos
    Votos de uma Feliz Quinta-Feira.

    ResponderExcluir

Obrigada por visitar-me. Adoraria saber sua opinião. Por favor, deixe seu comentário.

A RUA DOS AUSENTES - Parte 4

  PARTE 4 – A DÉCIMA TERCEIRA CASA   Eduína estava sentada em um banco do parque. Era uma cinzenta manhã de quinta-feira, e o vento frio...