segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

AMOR E REVOLTA – CAPÍTULO XVIII







-Olá, Max... que bom que você atendeu! 

-Oi, Gabi. 

Ela percebeu uma certa frieza na voz dele... ou seria impressão? Com Luis ao lado dela escutando a conversa, Gabi tentou controlar os nervos e ir direto ao assunto:

- Sabe, Max... hoje eu entrei no seu carro carregando uma bolsinha... acho que eu a esqueci no carro. Você poderia ver se ela está lá? 

Max suspirou de impaciência; achou que o assunto da bolsa seria apenas uma desculpa para que ela ligasse para ele. Não gostava de meninas grudentas. Mas ela insistiu:

-É muito importante! São uns documentos da minha mãe. Coisas da casa. Ela me mata se eu não encontrar. 

Ele concordou:

-Tá bem. Vou lá ver.

Max desceu as escadas e foi verificar o banco de trás do carro. Não achou nada lá. Minutos depois, ele ligou para ela:

-Não achei nada, Gabi. 

-Tem certeza?

-Acho que talvez você possa tê-la deixado em outro lugar. No carro, não está. 

Ele notou a preocupação dela:

-Ai, meu Deus...

-Mas se eu a encontrar, fique tranquila que eu devolvo a você. 

Dizendo aquilo, ele se despediu dela e desligou, voltando a assistir o documentário sobre corridas de carro. 

Naquele momento, todos já sabiam do que tinha acontecido. Gabi, junto com Luis tinha ido até o apartamento de Gertrude onde os outros já os esperavam. Ela pensava no quanto todos não sabiam o que poderiam fazer para que ela se sentisse ainda pior sobre seu ato irresponsável. Helena a acusou de relapsa, e Melissa nada disse, o que a deixou ainda mais ferida. Gertrude e Rafaela insistiam para que ela refizesse o percurso de cabeça, tentando lembrar-se de onde deixara a  pasta. Ela se viu obrigada a confessar seu momento mais íntimo com Max. 

Imediatamente, Rafaela decretou:

-Bem, então vamos até esse recôndito do amor! Com certeza, você deixou a pasta lá!

Dirigiram por mais de uma hora até chegarem ao local. No banco de trás, espremiam-se Gertrude, Helena, Luis e Melissa, e no banco da frente, Gabi indicava o caminho que Rafaela deveria seguir. 

Chegaram lá ao entardecer. Vasculharam todo o local, e não encontraram a pasta, é claro. 
Gabi chorava de frustração, pois seria odiada por Max e também por Marvin, quando ele soubesse do ocorrido. Eles não tiveram outro remédio, a não ser voltarem para suas casas e aguardar o resultado. Gabi começou a pensar que, caso a pasta fosse encontrada por alguém desconhecido, provavelmente esta pessoa iria ler o conteúdo da mesma e descarta-la por falta de interesse. Este pensamento pareceu deixa-la mais tranquila, mas à noite, ela não conseguia dormir.

No outro dia, Gertrude, aflita, telefonou para Rafaela:

-Filha, não sei mais o que fazer... não pude dormir à noite. Se aquela pasta ficou no carro e Max a achou e leu, a vida de Gabi pode estar em risco, pois ele vai pensar que foi ela sozinha que fez aquele dossiê. Pode mostrar ao pai, e ninguém sabe qual será a reação dele. Estou tão aflita!

-Calma, mãe, eles não são assassinos, são apenas corruptos. Eu acho que Max não encontrou a pasta. Se tivesse encontrado, precipitado do jeito que Marvin me disse que ele é, com certeza teria despejado sua raiva sobre Gabi quando ela ligou para ele. Vamos aguardar e ver o que acontece!

Mas eles não precisaram aguardar muito. Porque, nos jornais da manhã seguinte, os rostos de Sunny e Paco estavam estampados. As manchetes falavam do casal VIP que usava uma ONG para lavar dinheiro; faziam insinuações sobre tráfico de drogas e corrupção de menores. O escândalo explodiu dentro da família de Jane como uma bomba atômica. Nas redes sociais, vários memes sobre as festas de nudismo regadas à drogas e erva, e os rostos de Sunny, Paco, Jane e Max compartilhados centenas de milhares de vezes em postagens cheias de ódio e sarcasmo disfarçado de humor.

Do seu canto de observação, o Deputado Tavinho – responsável por todo aquele escândalo – fingia-se de amigo. Tivera o cuidado de editar o dossiê, apagando qualquer pista que pudesse ligar aqueles fatos às contribuições que ele fazia à ONG de Sunny. Dera uma entrevista falando sobre o assunto, alegando total inocência quanto ao que acontecia na ONG. Mais tarde, dissera a Paco (que não acreditou nele) que precisava ter feito aquilo, pois estava tentando desviar os repórteres e a polícia das direções que levavam aos fatos mais graves. 

Ao ver os jornais, Marvin sentiu o coração subir até à boca, e sem hesitar, pegou sua bicicleta e foi até a casa de Jane. Tocou a campainha; O mordomo atendeu, e reconhecendo sua voz, demorou alguns minutos antes de abrir o portão para ele. Marvin entrou no jardim com sua bicicleta, passando pela pequena multidão que se juntava em volta da casa, cobrindo o rosto com o moleton tentando evitar os repórteres e fotógrafos que enxameavam em volta dele, querendo saber quem ele era. Foi Jane quem abriu a porta para ele. Ela usava uma calça jeans surrada e camiseta, e tinha o rosto pálido e sem maquiagem e os cabelos presos em um rabo de cavalo baixo. Parecia muito abalada. Os dois se olharam, e sem nada dizerem, se abraçaram, tirando o jejum de vários dias separados. Jane se deixou levar por ele até o sofá da sala, e depois de chorar durante algum tempo, conseguiu parar de tremer e dizer:

-Muito obrigada por ter vindo, Marvin. Eu... eu estou me sentindo tão sozinha!

Ele acariciou o rosto dela, limpando as lágrimas com a palma da mão:

-Onde estão seus pais?

-Eles acharam melhor ir até a ONG, com medo de que fosse atacada. Há crianças lá dentro.

Na verdade, Jane e Paco estavam a caminho do aeroporto, mas não disseram nada aos filhos. Apenas tomaram um jato particular até uma pequena ilha que ambos possuíam, um paraíso desconhecido a todos, mesmo a amigos e parentes. Era um refúgio adquirido para situações como aquela que estavam enfrentando. Tinham achado melhor deixar os filhos em casa para que não pensassem que os dois estavam fugindo, mas apenas tratando de seus negócios como em um dia normal. Quando a poeira baixasse, estariam de volta, ou caso contrário, seguiriam de avião ou barco para a Bolívia, onde tinham um apartamento. Mais tarde, mandariam buscar os filhos. 

-E onde está seu irmão? 

-Não sei. Max dormiu fora, nem sei se viu os jornais. Tentei ligar para ele, mas ninguém responde. 

Com certeza está na casa de algum amigo, ou com alguma garota.

-Deixou recado?

-Sim, deixei. 

Ela foi até a janela. Não conseguia ver a rua dali, mas ouvia o burburinho dos repórteres. Jane sentia-se muito sozinha e desprotegida. Ao vê-la totalmente desarmada, a ternura que sentia por ela voltou com força total. Marvin disse:

-E se fôssemos lá para casa? Poderíamos sair na minha bicicleta pelo portão dos fundos. 

Jane demorou um pouco a responder. Parecia estar pensando. Disse:

-E seus pais? Sua família? O que eles vão pensar?

Sem hesitar, Marvin respondeu:

-Tenho certeza que está tudo bem, Jane. Eles a receberão lá de braços abertos. Vamos?

Ela pediu um tempo e foi até seu quarto, e pegando a mochila, colocou nela algumas mudas de roupa. Escreveu um bilhete dizendo onde estava, e deixou-o sobre a mesa de cabeceira da mãe. Antes de sair, olhou para o seu quarto, e respirando fundo, secou uma lágrima e fechou a porta atrás dela. 
Eles saíram pelos fundos da mansão. Marvin abriu uma pequena fresta do portão, e ao ver que a rua estava vazia, ambos montaram na bicicleta e se foram. No caminho, Marvin pensava no quanto Paco e Sunny tinham sido cruéis ao deixarem Jane totalmente sozinha em casa. 

Enquanto isso, em sua casa, a família discutia os últimos acontecimentos. Gabi acabara de ligar, dizendo que se lembrava com certeza de que tinha deixado a pasta no banco traseiro do carro de Max. Estavam todos reunidos na sala: Gertrude, Melissa, Rafaela, Cadu, Helena e Teófilo. Nervosas, Rafaela e Gertrude contaram aos outros membros da família sobre o dossiê. Cadu cobriu o rosto com as mãos, num gesto de desespero:

-Vocês estão loucas! E envolver crianças nisso, Gertrude! Quanta irresponsabilidade!

-Tenho que concordar com meu filho – disse Teófilo, que geralmente preferia não se envolver nos conflitos familiares. – Vocês duas agiram muito mal. Quem pensam que são, justiceiras?

Rafaela, furiosa, respondeu:

-Só estava pensando em ajudar o meu filho! Não o queria metido com aquela gente. Precisava saber quem eles são, com quem estamos lidando. Minha mãe apenas fez o que eu pedi, me ajudou. Mas não falamos nada com vocês justamente porque queríamos evitar essas caras acusadoras.

Helena não perdeu a oportunidade de criticar a nora:

-Pois é. Agora vejam só no que vocês se meteram. Imaginem só o que pode acontecer quando essa... essa quadrilha descobrir como isso tudo se tornou público! Imaginem, contratar hackers que navegam na tal de deep web para colher informações sobre essa gente! 

Rafaela bufou de impaciência:

-É, Helena. Mas foi o que fizemos. Não esperávamos que Gabi fosse deixar a pasta justamente no carro de Max. 

Melissa, que até o momento permanecera quieta, falou:

-Eu não sei como ela foi se envolver com ele. Os dois não têm nada a ver um com o outro! Acho que minha amiga enlouqueceu. Nem sei se vou voltar a falar com ela um dia. 

Cadu interferiu:

-Não deve deixar que isso afete a amizade de vocês, filha. Ela cometeu um erro, só isso. Foi irresponsável. Mas afinal de contas, Gabi só tem quinze anos. Mas você, Rafaela, tem 46! Deveria ter tido mais juízo e responsabilidade! E você, Gertrude... nem sei o que dizer...

As duas baixaram as cabeças, mas logo Gertrude saiu em sua defesa:

-Ora, eu só quis ajudar!

-E nos deixou a todos de fora, não pediu a opinião de ninguém, como sempre – disse Helena, a voz cheia de veneno e ressentimento. Na verdade, ela adoraria ter participado de todo o esquema. Teófilo interviu:

-Chega, Helena, não ponha ainda mais lenha na fogueira. 

Melissa levantou-se do sofá e começou a andar de um lado ao outro da sala:

-Imaginem só: alguém vai acabar chegando até Gabi! Quem achou a pasta no carro de Max  vai querer saber quem esteve no carro. Ai, meu Deus! O que pode acontecer? Se eles chagarem até ela... chegarão até nós... e esse tal Deputado Tavinho é um bandido, dizem até que já mandou matar gente...

Rafaela ergueu-se do sofá e  abraçou a filha:

-Não se preocupe, logo isso tudo será abafado e esquecerão o assunto. É assim que funciona nesse país. Logo alguma outra notícia bomba vai aparecer e ninguém falará mais no assunto.

Helena, com a voz cheia de reprovação, provocou:

-Vamos esperar que você esteja certa, Rafaela!

Teófilo cutucou-a com força para que se calasse. Gertrude suspirou profundamente:

-Oh, o que eu fui fazer... e a segurança das crianças está ameaçada...

Cadu respondeu:

-Calma, não vamos nos desesperar! 

-Tudo culpa sua, Rafaela! – vociferou Helena. 

Rafaela começou a gritar com ela, e logo estavam todos gritando. Foi assim que Marvin encontrou sua família quando chegou em casa de mãos dadas com Jane. No exato momento em que os viram parados à porta, todos se calaram e olharam para eles. 

Ao depararem com os dois jovens de mãos dadas, todos se esqueceram do motivo da briga. O rosto pálido e a expressão desamparada de Jane comoveu a todos. Até Melissa sentiu pena dela. Marvin murmurou:

-Mãe, pai, ela pode ficar aqui uns dias? É que ninguém sabe desta casa, e pensei que seria um lugar seguro. 

Cadu perguntou:

-Onde estão os pais dela?

O jovem casal se entreolhou, e pareciam tão desamparados, que até mesmo Helena ficou com lágrimas nos olhos:

-Não sei – disse Marvin. – pensávamos que eles estavam na ONG, mas Jane tentou ligar para eles para avisar aonde estava, e os dois números foram desligados.

Jane baixou os olhos, envergonhada diante do silêncio e dos olhos que pareciam fita-la e despi-la – não no corpo, mas na alma. Como se o gesto tivesse sido combinado, todos estenderam as mãos em direção aos dois. Rafaela caminhou até onde eles estavam, e abraçando a menina, trouxe-a para dentro da casa, acolhendo-a. Jane sentiu-se amada, amparada e muito bem recebida. Sentiu-se segura, realmente segura pela primeira vez na vida. 

(continua...)





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